O Termo Territorial Coletivo é um modelo de gestão coletiva do território no qual a terra pertence à comunidade como um todo — por meio de uma pessoa jurídica estabelecida para esse fim — enquanto que as casas pertencem individualmente aos seus residentes. Seu objetivo principal é garantir moradia acessível de forma contínua, a permanência das comunidades em seus territórios e o desenvolvimento comunitário a partir do protagonismo dos moradores.

Nessa cartilha, apresentaremos um panorama geral sobre o Termo Territorial Coletivo, buscando trazer as dimensões mais fundamentais do modelo. Para isso, passaremos pelos seguintes temas:

(i) histórico do TTC;

(ii) características essenciais;

(iii) estrutura jurídica e;

(iv) potencial do TTC para o Brasil.

HISTÓRICO DO TTC

Surgimento no meio rural dos EUA

O Termo Territorial Coletivo (TTC) é uma adaptação brasileira do modelo Community Land Trust (CLT). Ele nasceu em 1969, na zona rural do estado da Geórgia, no sul dos Estados Unidos, no contexto dos movimentos por direitos civis e justiça racial. Os primeiros TTCs foram pensados como mecanismos de aquisição de terras agrícolas para a subsistência e de comunidades negras marginalizadas pelas políticas de segregação. O princípio norteador das primeiras experiências foi o de assegurar um modelo fundiário que garantisse tanto o desenvolvimento econômico quanto a manutenção da terra nas mãos da comunidade.

Migração para as cidades

Apesar de surgir no meio rural, foi nas cidades que os TTCs ganharam visibilidade e se desenvolveram com rapidez. Os primeiros TTCs urbanos surgem nos anos 1980, implementados para garantir moradia acessível para comunidades urbanas vulneráveis de forma permanente. A partir dos bons resultados alcançados pelas primeiras experiências, o modelo ganhou relevância e aceitação entre legisladores e ativistas comunitários e se proliferou de forma acelerada por todo o território norte americano, que hoje conta com mais de 270 TTCs em funcionamento.

Disseminação pelo mundo

O TTC nasceu nos Estados Unidos, mas hoje já podemos encontrá-lo em diversos países do mundo, em todos os continentes. Historicamente, ele foi mais aplicado em países do Norte Global, como Inglaterra, Bélgica, Alemanha, França, Canadá e Austrália. No entanto, vemos experiências importantes em países do Sul Global, como Quênia, Porto Rico e Bolívia, que se utilizaram desse modelo para regularizar áreas ocupadas por assentamentos informais. Em 2017, o TTC foi reconhecido pela Nova Agenda Urbana da ONU como opção de moradia sustentável e acessível a ser encorajada pelos Estados.

CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS

 
 

Um dos aspectos mais importantes do Termo Territorial Coletivo é sua natureza flexível, capaz de se adaptar a diferentes contextos, desde favelas em Porto Rico a capitais de países europeus. No entanto, existem cinco características fundamentais que devem ser respeitadas em qualquer TTC.

  • o TTC não pode ser imposto de cima para baixo, sua instauração deve ser fruto da livre manifestação de vontade dos moradores de uma comunidade.

  • em todo TTC é criada uma organização comunitária, sem fins lucrativos, composta e gerida pelos moradores. Essa organização será a proprietária da terra e não poderá vendê-la. Assim, a terra é permanentemente retirada do mercado impossibilitando a atuação de especuladores imobiliários.

  • dentro do TTC, as casas e construções são de cada morador, de forma individual (o que inclui o quintal). Isso garante autonomia na gestão das moradias, sendo possível vender, alugar, deixar para os filhos, entre outros usos.

  • essa é talvez a característica mais importante do modelo. No TTC, a gestão territorial é feita pelos moradores de forma coletiva. É eleito um conselho gestor, que pode ser composto por moradores e aliados técnicos externos, em um formato a ser definido de acordo com as especificidades de cada comunidade. Além da atuação do conselho gestor, outros mecanismos participativos devem existir, como assembleias, consultas, comitês, etc. Quanto mais democrática e participativa for a gestão, mais sucesso terá o TTC na concretização dos interesses coletivos.

  • a acessibilidade econômica da moradia de forma permanente é um dos objetivos centrais do TTC. A retirada da terra do mercado faz com que apenas as construções possam ser objeto de trocas comerciais, o que por si só já reduz o valor das transações imobiliárias. Além disso, existem diversos mecanismos opcionais para manter os custos acessíveis da moradia, como a imposição de um teto para a venda e aluguel das casas, limitações acerca dos possíveis compradores e o estabelecimento de preferência do TTC para a compra das casas.

 

ESTRUTURA JURÍDICA DO TTC

Uma das facilidades do Termo Territorial Coletivo é que ele já pode ser implementado com o que temos na legislação vigente. Apesar disso, uma lei própria sobre o tema pode facilitar sua aplicação, garantindo mais segurança jurídica às experiências.

Podemos resumir a estrutura jurídica do TTC na seguinte figura:

 

VAMOS ÀS ETAPAS?

 

POTENCIAL DO TTC NO BRASIL

A partir de um arranjo que harmoniza interesses individuais e coletivos, o Termo Territorial Coletivo apresenta novos caminhos para se pensar a questão da habitação. Muito mais do que construir casas, é preciso garantir a permanência das pessoas em seus territórios (especialmente se tratando de famílias de baixa renda) e o fortalecimento das comunidades. Podemos elencar pelo menos cinco elementos que ilustram o potencial do TTC na garantia do direito à moradia e, de forma mais ampla, à cidade:

  • o TTC protege, no nível máximo, comunidades de ameaças de remoção, provocadas tanto pelo Estado quanto pelo mercado, assegurando de forma efetiva a permanência dos moradores em seus territórios.

  • o TTC dá as ferramentas necessárias para que comunidades possam se desenvolver com independência e protagonismo. Mais que isso: permite que os frutos do desenvolvimento sejam aproveitados pelos moradores, e não por terceiros que possam chegar para especular em cima da valorização da terra.

  • por meio da pessoa jurídica formada e gerida pelos moradores, que será a proprietária da terra, eles passam a ter poder de decisão sobre as intervenções em seu território.

  • a partir do momento que moradores se tornam coletivamente proprietários de uma grande área, seu poder de negociação muda de patamar. Eles poderão pressionar autoridades com mais força para exigir a prestação de serviços públicos e podem se organizar coletivamente, inclusive obtendo empréstimos e realizando obras por conta própria para implementar melhorias.

  • através da retirada da terra do mercado — e de outros mecanismos de controle de preço que podem ser estabelecidos na sua criação — o TTC consegue manter o custo da habitação acessível por famílias de baixa renda de forma permanente.

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